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A geração de ouro do Fluminense e o mau aproveitamento da base

Planejamento da diretoria não favorece a utilização de muitos jovens jogadores de Xerém



Foto: Lucas Merçon / Fluminense F.C.

“Uh vem que tem, é os moleques de xerém”. O famoso canto da torcida e dos jogadores da base fala muito sobre o carinho e relevância que esses jogadores têm para o clube. Apontado por muitos como dono de uma das melhores bases do Brasil, o Fluminense se apresenta como clube fora da Europa que mais vendeu jogadores para o exterior entre 2011 e 2020, segundo lista da FIFA, sendo grande parte dessas as vendas de jogadores formados no clube.


Observando de fora, o Fluminense realmente parece ser um dos clubes que mais utiliza os jogadores formados do clube, seja pelo momento de reestruturação econômica ou pela sequência de boas gerações que perdura desde o time campeão brasileiro na categoria sub-20 em 2015. Apenas no ano de 2020 foram utilizados 23 jogadores formados no clube, mas apesar dos números expressivos de vendas e utilização massiva de jogadores da base, o Fluminense ainda peca em um fator crucial para o real aproveitamento dos jogadores: a montagem de elenco – fator este que é o principal problema para o desenvolvimento de jogadores do clube.


Mas como pode um clube que tanto se utiliza da base errar na montagem de elenco? Basta observarmos a partir de uma ideia, a de que os jogadores da base devem ser utilizados para compor elenco e se possível até mesmo atuar como titulares. Ora, no momento em que você trata os jogadores da sua base como a “geração de ouro” é mais do que esperado que se tenha confiança nesses jogadores para que sejam pelo menos opções no banco de reservas, assim, liberando um investimento maior para contratação de jogadores titulares.


A partir desse ponto começamos então a discutir sobre a geração de ouro e seu aproveitamento. Para melhor contextualização, quando nos referimos a tal geração, estamos tratando do time vice-campeão da Copa do Brasil sub-17 de 2018. Esse foi composto por jogadores que nasceram em 2000 e 2001, e alguns nomes conhecidos são João Pedro, Marcos Paulo e Marcelo Pitaluga, que atuam na Europa, e Martinelli, André, Luís Henrique e Calegari, que atuam no profissional do time atualmente.


Luan Freitas


Foto: Mailson Santana / Fluminense F.C.

Dito isso, começamos a analisar a história dos jogadores desse time no profissional do Fluminense. O primeiro sobre o qual vamos discutir é o zagueiro Luan Freitas. Presente no time profissional do clube desde 2019, o jogador é reconhecido por sua técnica e boa saída de bola, fato que rendeu a ele algumas convocações para seleção brasileira sub-20.


O zagueiro é com certeza um dos jogadores que mais desperta expectativa da torcida tricolor, e até agora, mesmo depois de dois anos, possui apenas uma partida no profissional do clube. Nesse período, passaram pelo time diferentes zagueiros, e pode-se usar o argumento de que a partir de 2020 o setor da zaga ficou seguro e definido, dificultando assim a possibilidade de aproveitamento de tal jogador. Vimos, por exemplo, uma ótima campanha de Luccas Claro e Nino, e que, quando exigidos, Digão e Mateus Ferraz deram conta do recado.


Porém, quando chega o ano de 2021, começamos a observar os erros no setor. Com a saída de Digão e o aumento de competições importantes, o time se viu na necessidade de contratar jogadores para a posição. Quando Roger Machado assume o comando da equipe, ele pede a vinda de Manoel e David Braz, somando-se assim a Nino, Luccas Claro, Mateus Ferraz, Frazan e Rafael Ribeiro (jogador contratado para o sub-23, mesmo possuindo 26 anos).


Nesse momento a torcida já se perguntava: mas e Luan Freitas? O jogador era tratado como a oitava opção dentro do elenco, e mesmo depois da saída de alguns jogadores (Frazan para o CRB e Rafael Ribeiro para o Náutico), o zagueiro ainda não é tratado como prioridade, visto que, quando questionado sobre a renovação de Mateus Ferraz, que atuou na temporada em apenas cinco jogos do Campeonato Carioca, o presidente Mário Bittencourt afirmou que: “Zagueiro, se você tem seis, você tem cinco; se você tem cinco, você tem quatro; se você tem quatro, você não tem nenhum. Porque zagueiros se machucam muito, recebem muito cartão. E a experiência, hoje, me fez entender que é preciso ter um time de zagueiros para disputar três competições.”


A partir disso, uma pergunta faz-se necessária: será que um jogador tão promissor não é capaz de ser pelo menos a sexta opção dentro do clube? O caso de Luan Freitas traz algumas ressalvas, seja a boa relação de Mateus Ferraz dentro do elenco, seja a contusão sofrida no período que possuiria mais chances, mas é importante se discutir Luan Freitas porque ele aponta um dos principais perfis de jogadores que o clube possui hoje: o atleta promissor que pouco recebe chances pela saturação de jogadores na posição.


Martinelli


Foto: Mailson Santana / Fluminense F.C.

Vista a discussão sobre a zaga, partimos agora para o setor que receberá mais foco nesta análise, o meio campo titular do time dessa geração. O primeiro desses a ser analisado é Martinelli. O volante de 20 anos é com certeza um dos jogadores mais importantes do time principal, por muito tempo sendo tratado como unanimidade dentro do time titular e recebendo sondagens de clubes europeus.


O volante subiu para o profissional em 2020 e não havia recebido chances até sua estreia em novembro do ano passado, em jogo contra o Bragantino no segundo turno do Campeonato Brasileiro. Tal partida possuiu uma peculiaridade: o Fluminense entrou em campo com sete jogadores formados no clube entre os titulares, visto que passava no momento por um segundo surto de Covid e alguns jogadores estavam no departamento médico.


E a estreia de Martinelli nessa partida ilustra perfeitamente a utilização de jogadores da base pelo clube. Recapitulando um pouco, na temporada passada, o Fluminense tinha como opções para a posição de volante: Yago Felipe, Dodi, Hudson, Yuri, Ganso e como última opção André (que será abordado posteriormente). Para aquela partida, o clube havia perdido o titular incontestável Dodi, que não faria mais parte do elenco, e os demais se encontravam no departamento médico – fosse com lesões ou por Covid-19.


Sem poder contar com suas principais opções, o time entrou em campo com a dupla que fez sucesso na categoria de base: André e Martinelli estavam de volta ao meio-campo tricolor, agora jogando no futebol profissional. Após ótima estreia e com um time ainda desfalcado, o jogador ganhou a chance de ser titular novamente na partida seguinte contra o Atlhético Paranaense, mas apesar de uma boa atuação, teve a infelicidade de sair machucado e desfalcar o time pelas próximas cinco partidas do campeonato.


Porém, o desempenho do setor, que decaiu após saída de Dodi, era mais insatisfatório a cada partida, tendo Hudson e Yuri como os principais culpados. Naquele momento, Marcão optou por dar mais uma chance ao tão pedido Martinelli, e assim, a partir da partida contra o Sport, o volante tornou-se titular incontestável, atuando em 13 partidas naquele Campeonato Brasileiro e marcando três gols. O volante é hoje uma peça-chave no time, e é importante lembrar que para que Martinelli pudesse receber chance no profissional foi necessária uma conjuntura de um segundo surto de Covid, um jogador não renovar com o clube e outros dois estarem se recuperando de lesão. Por muito pouco este que foi citado não se tornou mais um Luan Freitas no elenco.


André


Foto: Felipe Siqueira

Mas tratando ainda sobre o setor, vamos falar sobre aquele que formou a tão famosa dupla de volantes da base: André. Apelidado na base por “Velho”, o jogador era o capitão daquele time. Sempre jogando de cabeça erguida e com muita confiança, demonstrava mais experiência do que os demais do time, fato esse que trouxe muita expectativa quanto à sua utilização no elenco principal.


O jogador começou a ser relacionado em julho de 2020 e estreou contra o Sport ainda no primeiro turno daquele Brasileirão. Possuindo uma atuação discreta, porém segura, foi substituído ainda no segundo tempo e a partir disso começou a receber mais chances no profissional, fazendo partidas em que não desempenhou tão bem sua função.


Até esse ponto, o clube vinha desempenhando com o jogador o papel correto na sua formação, afinal, é necessário entender as oscilações que jogadores passam ao subir para o futebol profissional. Então você deve estar se perguntando: onde está o erro? O erro está na montagem de elenco para 2021. Em uma temporada com tantas competições, o Fluminense buscou se reforçar e trazer jogadores experientes, mas o detalhe era que para a posição de volante o clube possuía os incontestáveis Yago e Martinellli, um promissor André e os tão questionados Hudson e Yuri.


Um ponto importante a se destacar é que Hudson se encontrava em processo de renovação com o clube, mas mesmo assim a diretoria optou pela contratação de Welington, jogador que possuía o mesmo perfil de Hudson e que chegava apenas para compor elenco. Resultado disso? O técnico Roger Machado por várias partidas optou pela utilização dos volantes mais experientes, enquanto André perdeu cada vez mais espaço, a ponto de pedir para ser emprestado.


Quando estava próximo de fechar com o Botafogo, um ponto-chave aconteceu: a lesão de Hudson, que o tirou o jogador do restante da temporada. Dessa forma, o Fluminense viu a necessidade de manter o volante promissor no clube, e com isso as chances começaram a surgir. Sempre muito indagado, visto as péssimas partidas de Welington, o técnico Roger Machado afirmava que André estava treinando bem e que receberia vaga assim que possível, acontecendo dessa forma.


No clássico contra o Flamengo então aconteceu sua virada de chave; entrando no fim do jogo, o volante marcou o gol da vitória, fato esse que era comum na base. A partir dessa partida, foi titular contra o Ceará pelo Campeonato Brasileiro e teve uma das atuações mais seguras do time na partida contra o Cerro Porteño na Libertadores. André então havia consolidado sua vaga de reserva e seria a primeira opção do técnico Roger. É isso que você deve estar pensando, e foi isso que a torcida pensou, mas na partida seguinte, o técnico optou por utilizar Welington contra o Grêmio com a justificativa de que: “É preciso fazer a gestão do elenco”.


E então novamente a utilização do volante esfriou, até a última tentativa de Roger Machado: a mudança de esquema contra o Internacional pelo campeonato brasileiro. Apesar da derrota por 4 a 2, a opinião da torcida era unânime: André foi o melhor em campo e o time melhorou muito com sua entrada. E a partir desse ponto essa foi a tônica dos próximos jogos, tornando-se corriqueiro ao torcedor o elogio às atuações de André e sua consolidação como titular.


E nesse ponto foi observado que, mais uma vez, para o Fluminense utilizar um dos seus promissores jogadores da base o acaso teve que ocorrer. Mas além disso, é necessário agora fechar o meio-campo, com mais um promissor jogador que espera nesse momento o seu acaso acontecer, ou novamente, já que desperdiçaram chances para seu aproveitamento. Seu nome é Wallace.


Wallace


Foto: Mailson Santana / Fluminense F.C.

Camisa 10 daquela geração, o meia era um dos destaques do time durante o ano de 2018, marcando oito gols no título do Campeonato Carioca sub-17 daquele mesmo ano. No entanto, logo no período de passagem para o clube profissional, sofreu uma lesão que esfriaria sua utilização, retirando-o de campo no ano de 2019, em que atuou em apenas seis partidas nas categorias de base do clube.


Porém, um jogador tão promissor assim não iria parar de ter destaque. Prova disso, no ano de 2020, o meia deu a volta por cima atuando nos times sub-20 e sub-23, chegando a atuar em nova posição também. Dessa forma, com a chegada de 2021, o jogador ganharia a chance de atuar nas duas primeiras partidas do Campeonato Carioca, nas quais o clube utilizou apenas os jogadores que atuam nas categorias de base do clube. Porém, o meia foi utilizado pelo técnico Aílton Ferraz em apenas dez minutos.


Apesar de pouco utilizado no profissional, o meia continuava chamando a atenção na categoria sub-23, e assim sempre aparecendo enquanto pedido da torcida, visto que as atuações de Welington pouco agradavam. Além disso, foi convidado por André Jardine para um período de treino junto à Seleção Brasileira sub-20, período esse que foi estendido pelo próprio treinador pelas atuações do meia o terem agradado.


Após sua volta da seleção, ocorreu outro episódio que freou sua utilização. Com a promessa de que seria integrado ao profissional após a volta do período de treino, o meia voltou ao Brasil, mas não recebeu tal chance. Diante disso, discutiu com colegas do time sub-23 e deixou o treino da equipe, sendo retirado dessa forma da delegação que viajaria para partida na cidade de Fortaleza, pelo Campeonato Brasileiro de Aspirantes.


Porém, tal episódio não apagou o talento de Wallace, que continuou se destacando no time de aspirantes, sendo sua utilização uma das perguntas frequentes nas coletivas do técnico Marcão, que afirmou ainda ver Welington à sua frente. Diante disso, o meia foi relacionado para partida das quartas de final da Copa do Brasil, devido às lesões de André e Martinelli.


Dito isso, o meia promissor ainda não recebeu a chance de atuar nos profissionais. Nesse ponto, quero destacar que seu papel nessa discussão é apenas para ilustrar as poucas chances que tais jogadores recebem. Não é garantia de que o meia irá atuar no profissional como atuou nas categorias de base, pelo contrário, o mais provável é que passe por períodos de oscilações assim como os demais jogadores que “sobem” para o profissional.


Outros problemas no aproveitamento da base

Não defendo nesse texto que o time deve utilizar apenas jogadores jovens que vêm da base. Na verdade, o clube deve ter muito cuidado quanto a sua utilização e gerir bem suas oscilações, como foi o caso de Luís Henrique, que depois de um bom período como titular, deixou de ser relacionado e agora volta a ser um titular incontestável; outro exemplo é Calegari, que após uma boa temporada em 2020, teve atuações ruins em 2021, mas já pede passagem no time titular novamente. Porém, é necessário que o clube saiba oferecer aos jogadores um plano de carreira e desenvolvimento para que possa realmente aproveitar o desenvolvimento desses jogadores e que estes passem mais tempo junto ao clube.


Basta lembrar que um dos motivos de Evanilson não renovar com o clube em 2019 foi por não receber chances durante aquele ano, mesmo sendo o artilheiro do campeonato sub-20, e após isso foi o principal atacante do clube durante o ano de 2020, mas deixou a equipe precocemente por conta de seu passe não ser do Fluminense – o clube, que possuía 60% dos direitos econômicos do jogador em 2019, passou a possuir 10% em 2020.


Ademais, basta lembrar que alguns outros jogadores daquela geração não receberam chance por mais erros da gestão em relação à montagem de elenco. Um bom exemplo é a lateral esquerda, o setor mais criticado pela torcida. Em 2020, o Fluminense assinou um contrato de três anos com Danilo Barcelos, que foi um pedido do técnico Odair Hellmann. Até aqui parece normal atender um pedido do treinador, o único problema é que a última vez que um treinador passou três anos seguidos no clube foi entre 1958 e 1962, com o técnico Zezé Moreira. Diante disso, o lateral Marcos Pedro não recebeu chances no time profissional.


Por fim, o último ponto a se destacar sobre a nocividade de uma má formação de elenco é que esta prejudica o aproveitamento tanto dos que não recebem chance como daqueles que recebem. Basta observar que as contratações do Fluminense no ano de 2020 saturaram algumas posições, como trazer mais dois centroavantes de características semelhantes a de Fred, e mais um meia de característica semelhante a Nenê, além dos volantes já citados nesse texto. Apesar disso, a diretoria não reforçou o setor de pontas do clube, fazendo com que jogadores como Kayky e Gabriel Teixeira estivessem jogando Libertadores antes mesmo de possuírem dez jogos como profissionais.


E o resultado disso? Apesar de vermos boas partidas da dupla em campo, vimos as oscilações acontecendo. O problema é que, diferente das outras posições em que os jogadores tiveram tempo para ser trabalhados, nesse caso não haviam outras opções, e os jogadores começaram a passar por mais e mais partidas em que não iam bem, prejudicando seu estado emocional e a confiança da torcida nesses jogadores. Além disso, visto as poucas opções de pontas que o clube teve durante a temporada, já que a única contratação para o setor ocorreu no mês de agosto, foi necessário a inserção precoce de Mateus Martins no setor – mais um jogador de 17 anos sendo utilizado sem obter ainda o preparo físico necessário.


Diante disso, termino essa análise reforçando esta ideia de que o mal planejamento de elenco é prejudicial para o clube, seja por não dar chances aos promissores jogadores da “geração de ouro”, seja por forçar a utilização de jogadores da “geração dos sonhos” (talvez tema de um próximo texto), como Kayky e Mateus Martins.


É bom ver jogadores formados no clube atuando, é bom vê-los fazendo história no clube, mas para que isso aconteça de forma positiva para o clube e para os jogadores é necessário calma e planejamento. Como torcedor, quero ver o desenvolvimento de todos os citados e não citados (como o zagueiro Davi Alves), porém, é necessário que estes tenham condições favoráveis para serem aproveitados e que recebam chances para se desenvolverem dentro do clube.


Saudações Tricolores.



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